Segundo a Secretaria Especial dos Portos (SEP), os portos brasileiros deverão crescer a taxas de 5,7% nos próximos 18 anos. Otimista, o ministro Leônidas Cristino afirma que, até 2030, a movimentação nos terminais portuários será duas vezes e meia superior à registrada atualmente. Para a SEP, o crescimento estará ancorado na ampliação dos investimentos em projetos de infraestrutura.

Os valores anunciados enchem os olhos. Mas não trazem nenhuma garantia quando confrontados com a morosidade com que as obras públicas vêm sendo tratadas nas últimas décadas. Além disso, 18 anos para sanar problemas severos como os que o setor está enfrentando, talvez seja tempo demais para que o país ganhe a confiança e as apostas dos investidores.

A contradição está no fato de o governo anunciar que, deste ano a 2017, o Executivo deve licitar 159 áreas para terminais portuários, sendo 42 para novos arrendamentos, enquanto as obras para infraestrutura que suportem esses terminais estariam concluídas até 2030. Pode-se concluir, portanto, que o gargalo dos portos deve ficar ainda mais apertado nos próximos anos, se o setor de agronegócios mantiver o mesmo desempenho ou aumentá-lo.

O pano de fundo desse otimismo é a Medida Provisória nº 595, que tem o objetivo de imprimir mais agilidade e produtividade aos portos. Porém, tal MP não toca nem de longe em questões de extrema importância para o setor, como, por exemplo, o descompasso entre a produtividade dos operadores em comparação com a da autoridade aduaneira: os principais portos do país operam 24 horas por dia, sete dias por semana; a aduana, cumpre horário comercial, cinco dias por semana.

Enquanto isso, governos municipais, estaduais e federal vão adotando medidas paliativas, abrindo ruas, intimando empresas a acabar com as filas, mas ninguém é capaz de um mea-culpa pelos atrasos inexplicáveis de obras que são necessárias há décadas. Medidas miraculosas estão sendo propostas como a salvação da lavoura. Por exemplo, desviar as cargas do Sudeste para portos do Norte e do Nordeste. Quanto tempo seria necessário para tornar as estradas de acesso ao Nordeste transitáveis e seguras? Torná-las adequadas a serviço do agronegócio exige tempo, dinheiro e comprometimento.

Aprovar a MP nº 595 açodadamente, jogando as questões que realmente importam para debaixo do tapete, só vai alimentar o caos e afastar investidores. A verticalização do mercado, por exemplo, com a entrada de armadores na operação portuária, vai criar condições privilegiadas entre a concorrência, mas, sobre isso, nenhuma palavra até agora no rol de discussões dentro da comissão que busca consenso entre empresários e governo.

É inexplicável o esvaziamento do poder das Companhias Docas, cujas principais atribuições passariam para a SEP, de acordo com a MP nº 595. Nem a China mantém centralização tão rigorosa. Se as Companhias Docas são ineficientes, melhor seria começar a reforma por elas, imprimindo agilidade e qualificação, tirando delas o caráter perceptível de abrigo político. Até as cracas sabem que o ministério não terá agilidade suficiente para gerir sozinho todo esse complexo de estrutura logística.

O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, jogou mais lenha nessa fogueira ao sugerir, durante reunião com a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que Pernambuco deve ficar fora dessa MP, como se tal manobra fosse possível. Endureceu a crítica contra a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), afirmando que o órgão demora dois anos para decidir um processo.

A pressa na aprovação da MP, na forma original ou com medidas cosméticas e midiáticas, vai representar atraso maior do que o que estamos vivendo, num futuro muito próximo. E é bom lembrar que está nas mãos desse setor boa parte do desenvolvimento e do crescimento da balança comercial e, portanto, da economia.

Fonte: Correio Braziliense

Fernando Camara

Engenheiro e consultor na área de gestão estratégica

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